Posso escrever os versos mais tristes esta noite Escrever por exemplo: A noite está fria e tiritam, azuis, os astros à distância Gira o vento da noite pelo céu e canta Posso escrever os versos mais tristes esta noite Eu a quis e por vezes ela também me quis Em noites como esta, apertei-a em meus braços Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito Ela me quis e as vezes eu também a queria Como não ter amado seus grandes olhos fixos ? Posso escrever os versos mais lindos esta noite Pensar que não a tenho Sentir que já a perdi Ouvir a noite imensa mais profunda sem ela E cai o verso na alma como orvalho no trigo Que importa se não pode o meu amor guardá-la ?
A noite está estrelada e ela não está comigo Isso é tudo A distância alguém canta. A distância Minha alma se exaspera por havê-la perdido Para tê-la mais perto meu olhar a procura Meu coração procura-a, ela não está comigo A mesma noite faz brancas as mesmas árvores Já não somos os mesmos que antes havíamos sido Já não a quero, é certo Porém quanto a queria ! A minha voz no vento ia tocar-lhe o ouvido De outro. será de outro Como antes de meus beijos Sua voz, seu corpo claro, seus olhos infinitos Já não a quero, é certo, Porém talvez a queira Ah ! é tão curto o amor, tão demorado o olvido Porque em noites como esta Eu a apertei em meus braços, Minha alma se exaspera por havê-la perdido Mesmo que seja a última esta dor que me causa E estes versos os últimos que eu lhe tenha escrito.
Eu sou português aqui em terra e fome talhado feito de barro e carvão rasgado pelo vento norte amante certo da morte no silêncio da agressão.
Eu sou português aqui mas nascido deste lado do lado de cá da vida do lado do sofrimento da miséria repetida do pé descalço do vento.
Nasci deste lado da cidade nesta margem no meio da tempestade durante o reino do medo. Sempre a apostar na viagem quando os frutos amargavam e o luar sabia a azedo.
Eu sou português aqui no teatro mentiroso mas afinal verdadeiro na finta fácil no gozo no sorriso doloroso no gingar dum marinheiro.
Nasci deste lado da ternura do coração esfarrapado eu sou filho da aventura da anedota do acaso campeão do improviso, trago as mão sujas do sangue que empapa a terra que piso.
Eu sou português aqui na brilhantina em que embrulho, do alto da minha esquina a conversa e a borrasca eu sou filho do sarilho do gesto desmesurado nos cordéis do desenrasca.
Nasci aqui no mês de Abril quando esqueci toda a saudade e comecei a inventar em cada gesto a liberdade.
Nasci aqui ao pé do mar duma garganta magoada no cantar. Eu sou a festa inacabada quase ausente eu sou a briga a luta antiga renovada ainda urgente.
Eu sou português aqui o português sem mestre mas com jeito.
Eu sou português aqui e trago o mês de Abril a voar dentro do peito.
M'en voudrez-vous beaucoup si je vous dis un monde Qui chante au fond de moi au bruit de l'ocean M'en voudrez-vous beaucoup si la revolte gronde Dans ce nom que je dis au vent des quatre vents Ma memoire chante en sourdine : Potemkine.
Ils etaient des marins durs a la discipline Ils etaient des marins, ils etaient des guerriers Et le coeur d'un marin au grand vent se burine, Ils etaient des marins sur un grand cuirassé Sur les flots je t'imagine : Potemkine.
M'en voudrez-vous beaucoup si je vous dis un monde Ou celui qui a faim va etre fusillé Le crime se prepare et la mer est profonde Que face aux revoltés montent les fusiliers C'est mon frére qu'on assassine : Potemkine.
Mon frére, mon ami, mon fils, mon camarade Tu ne tireras pas sur qui souffre et se plaint Mon frére, mon ami, je te fais notre alcade Marin, ne tire pas sur un autre marin Ils tournerent leurs carabines : Potemkine.
M'en voudrez-vous beaucoup si je vous dis un monde Ou l'on punit ainsi qui veut donner la mort M'en voudrez-vous beaucoup si je vous dis un monde Ou l'on n'est pas toujours du coté du plus fort Ce soir j'aime la marine : Potemkine
Sou de outras coisas pertenço ao tempo que há-de vir sem ser futuro e sou amante da profunda liberdade sou parte inteira de uma vida vagabunda sou evadido da tristeza e da ansiedade
Sou doutras coisas fiz o meu barco com guitarras e com folhas e com o vento fiz a vela que me leva sou pescador de coisas belas, de emoções sou a maré que sempre sobe e não sossega
Sou das pessoas que me querem e que eu amo vivo com elas por saber quanto lhes quero a minha casa é uma ilha é uma pedra que me entregaram num abraço tão sincero
Sou doutras coisas sou de pensar que a grandeza está no homem porque é o homem o mais lindo continente tanto me faz que a terra seja longa ou curta tranco-me aqui por ser humano e por ser gente
Sou doutras coisas sou de entender a dor alheia que é a minha sou de quem parte com a mágoa de quem fica mas também sou de querer sonhar o novo dia
" Todos nós somos memória, e a memória, para o bom e para o mal, é a única coisa que não nos podem roubar".
Cantares de Amigos
"É possível falar sem um nó na garganta é possível amar sem que venham proibir é possível correr sem que seja a fugir. Se tens vontade de cantar não tenhas medo: canta. É possível andar sem olhar para o chão é possível viver sem que seja de rastos. Os teus olhos nasceram para olhar os astros. Se te apetece dizer não grita comigo: não. É possível viver de outro modo. É possível transformares em arma a tua mão. É possível o amor é possível o pão. É possível viver de pé! Não te deixes murchar. Não deixes que te domem. É possível viver sem fingir que se vive. É possível ser homem. É possível ser livre."
Manuel Alegre
"Primeiro levaram os comunistas, mas não me importei com isso eu não era comunista. Em seguida levaram alguns operários, mas não me importei com isso eu também não era operário. Depois prenderam os sindicalistas, mas não me importei com isso porque eu não sou sindicalista. Depois agarraram uns sacerdotes, mas como não sou religioso também não me importei. Agora estão-me a levar a mim Mas já é tarde..."
(Bertold Brecht)
“A minha vida é um vendaval que se soltou. É uma onda que se alevantou. É um átomo a mais que se animou... Não sei por onde vou, Não sei para onde vou, Sei que não vou por aí.”
José Régio
"Oh! Esta comoção de me sentir sozinho no meio da multidão - a ouvir o meu coração no peito do vizinho Oh! Esta solidão quente como a camaradagem do vinho!
José Gomes Ferreira, Comício"
"Homem, abre os olhos e verás em cada outro homem um irmão. Homem, as paixões que te consomem não são boas nem más. São a tua condição. A paz, porém, só a terás quando o pão que os outros comem, homem, for igual ao teu pão.
Armindo Rodrigues"
"Quando desembarcas em Lisboa, Céu celeste e rosa, estuque branco e ouro pétalas de ladrilho as casas, as portas, os tectos, as janelas salpicadas do ouro verde dos limões, do azul ultramarino dos navios, quando desembarcas não conheces, não sabes que por detrás das janelas escuta ronda a polícia negra, os carcereiros de luto de Salazar, perfeitos filhos de sacristia e calabouço despachando presos para as ilhas, condenando ao silêncio pululando como esquadrões de sombras sob janelas verdes, entre montes azuis, a polícia, sob outonais cornucópias, a polícia procurando portugueses, escavando o solo, destinando os homens à sombra.